O universo dos drones está crescendo a cada dia, e com ele, a paixão por capturar imagens incríveis ou apenas se divertir pilotando.
Mas, junto com a empolgação, vem uma dúvida crucial que todo piloto, do iniciante ao mais experiente, precisa ter na ponta da língua: “Pode voar drone perto de pessoas?”
A resposta, como em quase tudo no mundo dos drones, envolve conhecimento, responsabilidade e, claro, a legislação.
Eu sou Rafael Corrêa, Delegado de Polícia Civil e criador do Doutor Drone, um projeto que nasce para descomplicar a legislação e as melhores práticas no uso desses fascinantes equipamentos. Como instrutor de voo e legislação para forças de segurança e pilotos recreativos, sei que a segurança é o nosso voo mais importante. Vamos entender juntos o que você precisa saber para voar com tranquilidade e, acima de tudo, dentro da lei.
Classificação dos Drones e As Normas Principais
No Brasil, os drones são tecnicamente chamados de Aeronaves Remotamente Pilotadas (RPA) e são parte de um sistema maior, o Sistema de Aeronave Remotamente Pilotada (RPAS), que inclui a aeronave, a estação de pilotagem e o enlace de pilotagem.
A ANAC e o DECEA são os órgãos responsáveis por regulamentar esses equipamentos, e suas regras variam principalmente de acordo com o Peso Máximo de Decolagem (PMD) da RPA.
Para que não restem dúvidas, a classificação oficial da ANAC (RBAC-E 94) é a seguinte:
- Classe 1: Drone com PMD maior que 150 kg.
- Classe 2: Drone com PMD maior que 25 kg e menor ou igual a 150 kg.
- Classe 3: Drone com PMD menor ou igual a 25 kg.
No Doutor Drone, nosso foco principal é nos drones da Classe 3, que englobam a vasta maioria dos equipamentos usados para lazer, hobby e muitos usos profissionais.
As normas essenciais para esses drones são o RBAC-E 94 da ANAC (Emenda 3) e o MCA 56-2 do DECEA (para voos recreativos, de lazer e de hobby) ou o ICA 100-40 do DECEA (para voos não recreativos/profissionais).
Mas em breve chegará o RBAC 100 da ANAC que substituirá o RBAC-E 94. Algumas mudanças boas virão!
Voar Perto de Pessoas: Aglomerações e Áreas Distantes de Terceiros
Agora, vamos ao ponto central: voar perto de pessoas.
- Aglomerações de Pessoas: Proibição Absoluta (para voos recreativos) A regra mais importante e categórica, presente no MCA 56-2 do DECEA, é que você não pode operar seu drone (RPA) sobre aglomerações de pessoas. Isso significa que locais com grande concentração de indivíduos, como shows, eventos esportivos, manifestações, praias lotadas ou festas, são estritamente proibidos para voos recreativos. A razão é simples: um acidente sobre uma multidão pode ter consequências catastróficas.
- “Área Distante de Terceiros“: O Conceito Vital Para além das aglomerações, a ANAC e o DECEA definem o que é uma “área distante de terceiros”. Esse conceito significa uma área, determinada pelo piloto, onde pessoas que não estão envolvidas ou não deram sua anuência (ou seja, pessoas não envolvidas e não anuentes) não estão submetidas a um risco inaceitável à segurança.
E aqui vem o ponto crucial: em nenhuma hipótese a distância da RPA poderá ser inferior a 30 metros horizontais de pessoas não envolvidas e não anuentes com a operação.
Exceção 01: O limite de 30 metros não precisa ser observado caso haja uma barreira mecânica suficientemente forte para isolar e proteger as pessoas não envolvidas e não anuentes na eventualidade de um acidente. É o caso de voos em ambientes fechados com redes de proteção, por exemplo.
Exceção 02: Se você estiver usando um drone com peso máximo de decolagem até 250 gramas você pode voar perto de pessoas não anuentes, mas isso não significa que você pode voar no meio delas, as colocando em risco. Essa permissão tem a ver com a possibilidade de decolar e pousar com mais facilidade, mas em situação permite voar gerando risco para elas.
Importante notar: Embora os 30 metros sejam um critério da ANAC para a aplicação das regras, o acesso ao espaço aéreo é do DECEA, que pode estabelecer limites diferentes ou de maior magnitude em situações específicas.
Quem São as Pessoas que Podem Estar Perto do Drone?
Para entender melhor as regras, é fundamental conhecer os tipos de pessoas que podem ou não estar próximas à operação do seu drone:
- Pessoa Envolvida: É alguém cuja presença é indispensável para que a operação do drone seja bem-sucedida. Exemplos: o próprio piloto remoto (a pessoa que manipula os controles de voo), o observador de segurança (spotter), o técnico que manuseia o drone no local, etc. Essas pessoas, por estarem ativamente participando, estão cientes dos riscos.
- Pessoa Anuente: É uma pessoa que não é indispensável para a operação, mas que, por vontade própria e ciente dos riscos, concorda expressamente (e por sua conta e risco) que o drone opere perto dela ou de seus tutelados legais (no caso de menores de idade), sem a necessidade de observar os critérios dos 30 metros de distância. A ANAC esclarece que, ao dar essa anuência, a pessoa assume o risco, pois não é possível garantir um nível de segurança aceitável nessas condições.
Ou seja, a proibição de voar sobre pessoas se refere especificamente a pessoas não envolvidas e não anuentes.
Dicas de Segurança Práticas para Pilotos Conscientes
Mesmo quando a lei permite, a responsabilidade é sempre do piloto. Aqui vão algumas dicas essenciais para voar com segurança, protegendo a si mesmo e a terceiros:
- Mantenha Sempre a Linha de Visão Direta (VLOS): O piloto remoto deve sempre ter seu drone (RPA) à vista, sem auxílio de binóculos ou lentes. Se você não o vê, não o controla adequadamente.
- Verifique o Clima Antes de Decolar: Vento forte, chuva ou neblina podem comprometer a estabilidade do drone e causar acidentes.
- Realize um Check-list Pré-Voo Completo: Verifique baterias (do drone e do controle), hélices, status dos sensores, calibração da bússola e se há atualizações de firmware pendentes.
- Não Voe Sob Influência: Álcool ou outras substâncias afetam sua capacidade de pilotagem e podem gerar sérias consequências legais e criminais.
- Respeite a Privacidade: Mesmo que legalmente você possa voar em um local, evite invadir a privacidade alheia filmando ou fotografando pessoas em suas propriedades privadas sem consentimento, conforme a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
- Esteja Atento ao Entorno: Observe pessoas, animais, árvores, fios, cabos e outros obstáculos, incluindo aeronaves tripuladas que têm prioridade no espaço aéreo.
- Tenha um Plano B: Pense no que fazer em caso de emergência (perda de sinal, falha de bateria). Onde você pousaria o drone com segurança, longe de pessoas e propriedades?
Riscos e Consequências de Voar Irregularmente
Ignorar as regras e voar sem responsabilidade pode trazer sérias consequências, que vão desde a segurança até implicações legais gravíssimas:
- Acidentes e Lesões Graves: Drones podem causar ferimentos graves e até fatais, especialmente em quedas sobre pessoas ou veículos.
- Danos Materiais: Destruição de propriedade alheia e prejuízos financeiros significativos.
- Multas Pesadas: A ANAC e o DECEA podem aplicar multas elevadas, que variam de R$ 500 a R$ 300.000,00 por infrações às normas do setor aéreo.
- Processos Judiciais: Você pode ser responsabilizado civil e criminalmente por danos, lesões corporais, homicídio culposo ou doloso (dependendo da intencionalidade), invasão de privacidade, e outras infrações que podem ser enquadradas no Código Penal, como exposição a perigo ou atentado contra a segurança do transporte aéreo.
A Dica do Doutor Drone (Rafael Corrêa):
“Como Delegado de Polícia Civil e apaixonado por drones, vejo diariamente a importância de cada um fazer a sua parte. O uso irregular de drones não só coloca pessoas em risco, como também mancha a reputação de toda uma comunidade de pilotos responsáveis. O conhecimento é a sua melhor ferramenta de segurança. Voar legalmente é voar com inteligência e responsabilidade, protegendo a si mesmo e aos outros. Lembre-se, um ‘Doutor’ sabe que a prevenção é sempre o melhor caminho.”
Conclusão
Voar drone perto de pessoas é um tema que exige muita atenção e, acima de tudo, responsabilidade e conhecimento técnico-legal. A regra de ouro é evitar aglomerações e sempre priorizar a segurança, mantendo a distância mínima de 30 metros de pessoas não envolvidas e não anuentes, salvo com barreiras de proteção adequadas. Conhecer e respeitar as regulamentações da ANAC (RBAC-E 94) e do DECEA (MCA 56-2 e ICA 100-40) não é um luxo, mas uma necessidade inegociável para quem deseja desfrutar do universo dos drones sem problemas e dentro da lei.